Somos os povos das florestas, dos lavrados, dos rios, das cidades, dos quilombos, das comunidades indígenas e camponesas e de organizações sociais do Brasil, Peru, Equador, Bolívia, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Somos a força viva da Pan-Amazônia. Somos muitas vozes falando centenas de idiomas, fazendo o mesmo chamado: é preciso deter a máquina que empurra o planeta e a humanidade para o abismo. Dar fim ao sistema capitalista que transforma a natureza e as pessoas em mercadoria e sobrevive às custas da exploração e humilhação de bilhões de seres humanos. Dizemos que é tempo de libertar o trabalho e a imaginação para reinventar a Terra e fazer dela a casa comum onde todos vivam com justiça e liberdade.
Somos diferentes por isto somos fortes. Irmãos e Irmãs unidos na rejeição de um mundo onde a produção e a distribuição das mercadorias se guia pelo lucro e não pela satisfação das necessidades humanas. Somos de muitos povos, distintos e mesclados. Por isto rechaçamos o pensamento único, o viver uniforme, as imposições econômicas, sociais, políticas, sexuais e culturais. Instituímos a cultura e a comunicação como armas para combatermos a dominação, a violência, o terror e a propriedade. Nos unimos à cultura das múltiplas rebeliões a favor da vida e da dignidade, por justiça e liberdade. Todas as culturas para todos. Somos assim: lutamos para construir um mundo onde caibam todos os mundos.
Compartilhamos utopias e lutas concretas. Proclamamos que a terra não pode ser propriedade e privilégio de alguns. Terra e água são bens comuns e não podem ser comercializados. Todo latifúndio é um crime contra a humanidade e como tal deve ser combatido. Reafirmamos nosso repúdio à exploração privada dos recursos naturais. Como a terra é de todos o seu uso deve ser responsabilidade de todos/as os/as cidadãos e cidadãs, atuando através de estados que devem ser controlados para refletirem a vontade e os direitos dos povos que representam.
O direito dos povos originários de manterem suas culturas, suas identidades e seus territórios é sagrado. Povos indígenas e quilombolas devem ter suas terras demarcadas e juntamente com as comunidades tradicionais ter reconhecidos seus direitos à autonomia e ao auto-governo sem que isto signifique separatismo ou cisão do território nacional. Isto significa que nenhum projeto pode ser implantado sem o prévio consentimento das comunidades que vivem nestes territórios. Somos contra os modelos energéticos que alteram a geografia, destroem o meio-ambiente, desalojam populações, afogam culturas, gerando miséria e sofrimento. Somos contra o agronegócio e modelos que exploram a terra com o intuito de lucro. Defendemos o direito inalienável de todos os seres humanos de viverem em paz, com saúde, educação, moradia e todas as garantias para desenvolverem plenamente suas potencialidades.
Milhões de amazônidas vivem nas áreas urbanas em grandes, médias e pequenas cidades. Todavia, não existem políticas públicas adequadas às diferentes realidades. Com isto são excluídos do acesso aos bens e serviços públicos, agravando ainda mais os problemas sociais e ambientais. Lutamos pelo direito à cidades democráticas e sustentáveis na Pan-Amazônia.
Não aceitamos a criminalização dos movimentos sociais e dos/as defensores/as dos Direitos Humanos, promovida pelas empresas multinacionais com o apoio dos aparatos estatais, que em nome do desenvolvimentismo tentam impedir a liberdade de manifestação e organização dos que lutam contra um modelo concentrador e excludente. Da mesma forma exigimos a anistia de todos/as companheiros e companheiras que estejam presos e ameaçados de morte por defenderem estes direitos.
Na Pan-Amazônia, muitos irmãos e irmãs já derramaram seu sangue por justiça e liberdade. Honramos seus nomes e seremos dignos de seu legado.
Com todas as nossas forças combatemos o racismo, o machismo e qualquer forma de agressão à livre opção religiosa e orientação sexual. Lutamos pelo fim do preconceito e pela inclusão dos portadores de deficiências. Lutamos pelo fim das fronteiras que não impedem a livre circulação de capitais, mas proíbem o direito de ir e vir dos seres humanos.
Lutamos para barrar o modelo de desenvolvimento que provoca a violência, a prostituição e a exploração sexual de meninas e mulheres; que amplia a expropriação do conhecimento tradicional de parteiras, artesãs, extrativistas, camponesas, que tem seu trabalho precarizado e patenteado por empresas multinacionais e transnacionais, limitando ainda mais as garantias de direitos e autonomia das mulheres. Acreditamos que um outro mundo é possível e lutamos para construí-lo.
Temos os olhos no horizonte e os pés plantados no chão. Nos solidarizamos com a resistência de nossos irmãos e irmãs da Amazônia Peruana em defesa de suas terras e contra a implantação do Tratado de Livre Comércio entre o Peru e os Estados Unidos. Exigimos o fim da militarização dos territórios dos povos originários, particularmente na Colômbia, ao mesmo tempo em que clamamos pelo fim da sangrenta guerra civil. Rechaçamos bases e tropas estrangeiras nos países da Pan-Amazônia e do continente americano. Expressamos nosso apoio aos esforços desenvolvidos para lograr a independência da Guiana do domínio francês, acabando assim com o último bastião continental do colonialismo em nossa América. Da mesma forma nos juntamos às vozes que exigem em Honduras a queda do regime golpista e o retorno da democracia; o fim do bloqueio econômico à Cuba; a retirada das tropas estrangeiras do Haiti e apóiam uma Palestina livre e independente.
Nos anos recentes, a América Latina tem vivido momentos preciosos na sua jornada de libertação. Defendemos que os acordos de integração regional resultem na supressão do fosso que separa os países sul-americanos, promova a sustentabilidade na Pan-Amazônia ao invés da pura exploração dos recursos naturais. Neste sentido, iniciativas como o Banco do Sul, a Unasul devem fortalecer a integração dos povos e não apenas os interesses econômicos. Da mesma forma reconhecemos a importância de outras iniciativas como a ALBA e o Tratado de Comércio para os Povos. Reconhecemos nas propostas do Bom Viver e dos Direitos da Natureza, elementos fundamentais na construção de um mundo novo.
Somos contra iniciativas que não contam com o consentimento das populações afetadas, como fazem o IIRSA e os tratados de livre comércio entre a União Européia e países latinoamericanos. Nos opomos à política de incentivo e envio de colonizadores para nossas regiões. Apoiamos políticas como a proposta equatoriana do Yasuni que promove a conservação dos recursos para as próximas gerações.
Até chegarmos aqui percorremos um longo caminho. Herdamos as experiências de quatro edições do Fórum Social Pan-Amazônico, precedidos por Encontros Sem–Fronteiras, base fundamental na construção de alianças entre os povos da Pan-Amazônia. Também somos fruto da Assembléia Pan-Amazônica, realizada no último Fórum Social Mundial, em Belém do Pará. Sabemos que a Pan-Amazônia é um dos mais importantes cenários da batalha que se trava pela salvação do planeta e da humanidade. A sabedoria de nossos antigos, transmitida ao longo de séculos de resistência, nos fazem compreender a necessidade de nos unirmos, trançando num único tecido as nossas muitas diferenças.
Neste encontro celebramos muitas alianças. Uma das mais importantes foi estabelecida com os povos da Cordilheira dos Andes, juntando assim o grande rio das nascentes até a foz numa grande torrente, alimentada por inúmeros afluentes, em direção à Terra Sem Males, proclamada por nossos antepassados.
Aqui também estabelecemos compromissos. Concordamos em coordenar nossos esforços, buscando uma maior eficácia em nossas ações. Neste sentido, participaremos de maneira coletiva e organizada da Semana de Mobilização Global de Luta pela Mãe Terra e contra a Colonização e a Mercantilização da Vida, de 12 a 18 de outubro de 2009. Nestes dias, a Pan-Amazônia de forma articulada, múltipla e unificada, marcará sua presença em defesa da vida, da soberania alimentar e do Bem Viver.
Estamos prontos para seguir adiante. O Conselho Pan-Amazônico, reconstituído neste encontro, tomará as medidas para assegurar a incessante troca de informações, práticas compartilhadas de comunicação, solidariedade permanente e ações coordenadas, a preparação e realização do V Fórum Social Pan-Amazônico, que será parte integrante do processo do Fórum Social Mundial, rumo à edição de Dacar, em Senegal, em 2011.
No fundo da selva os povos da floresta fazem ouvir sua voz.
Viva a Pan-Amazônia de todas as cores e todos os povos!
Belém | Pará | Brasil | 14 a 17 de julho de 2009.