(Pronunciamento do Senador José Nery no Senado Federal – 22/04/2009)
Senhor Presidente,
Senhores Senadores,
Senhoras Senadoras,
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-terra – MST realiza neste mês mais uma jornada nacional de luta. Divulgo aqui os principais motivos que leva milhares de trabalhadores a voltarem a ocupar fazendas, estradas e prédios públicos, única forma encontrada para que as suas reivindicações sejam ouvidas neste Congresso e especialmente no Palácio Presidencial.
A crise chegou com força no campo brasileiro. Os latifúndios do agronegócio já desempregaram 270 mil trabalhadores assalariados, desde novembro de 2008. As 20 maiores agroindústrias desempregaram quase 100 mil operários de suas fábricas. O MST denuncia que essas empresas continuam recebendo apoio governamental, enquanto trabalhadores rurais pobres do campo ficam em segundo plano.
As verbas federais para apoiar a pequena produção e assentar famílias foram cortadas. Senão vejamos:
1. Os recursos para desapropriação, aprovados no orçamento de 2009, eram de R$ 957 milhões e foram cortados ‘em função da crise’. Eles foram reduzidos em 41%, baixando o orçamento para R$ 561 milhões. Segundo o Incra, com essa redução será possível assentar apenas 17 mil famílias e não mais 75 mil, meta anteriormente prevista pelo governo para o ano de 2009.
2. Os recursos aprovados para assistência técnica das famílias assentadas, previstos para 2009, eram de R$ 224 milhões, mas foram reduzidos para R$135 milhões. Redução também de 41%.
3. Para o Pronera, programa de educação nas áreas de Reforma Agrária, os recursos aprovados para 2009 – eram de R$ 69 milhões – foram cortados em 62%, baixando para apenas R$ 26 milhões.
4. Ano passado foi acordado com o governo a liberação de R$18 mil por família para o programa de habitação rural a ser implementado em 2009, para a construção e reformas de moradias no campo. O MST denuncia que os recursos foram baixados para R$10, 6 mil reais por família neste ano. E perguntam: alguém consegue construir uma casa com R$10 mil?
Outra queixa dos trabalhadores rurais é que o Incra vem usando índices de produtividade, que fixam os parâmetros necessários para desapropriação das áreas, com dados de produção ainda de 1975, totalmente defasados, o que dificulta classificar as fazendas como improdutivas. A lei agrária determina que os índices sejam atualizados a cada cinco anos. É urgente que eles sejam atualizados com os dados do censo agropecuário de 2006, e se publique nova portaria.
Afirmam também que o governo se comprometeu, na chegada da marcha a Brasília em maio de 2005, a abrir uma linha de crédito para financiamento especial de agroindústrias em assentamentos. A demanda era de R$150 milhões, mas apenas R$ 20 milhões estão assegurados para os próximos dois anos. Por outro lado, o governo liberou R$12 bilhões via Banco do Brasil e BNDES como socorro de capital de giro para as 20 maiores agroindústrias do país, que estão em crise e já demitiram quase 100 mil trabalhadores.
Um dos pontos mais questionados pelos movimentos sociais é a liberação de sementes transgênicas. Concordo com eles quando afirmam que o governo sempre se deixou influenciar pelos interesses econômicos das empresas transnacionais do agronegócio, para liberar vergonhosamente as sementes transgênicas, sem nenhum estudo sério de impacto ambiental e de saúde. Na fila da CTNBio estão novas licenças de arroz, milho etc. Nesta semana, porém, um juiz do Rio Grande do Sul aceitou uma demanda dos agricultores gaúchos contra o pagamento de royalties para a Monsanto. Além disso, o governo da Alemanha proibiu em seu território o cultivo da soja roundup, da Monsanto. No ano passado, o governo liberou três variedades de milho transgênico da Bayer, Syngenta e Monsanto. A produção de sementes de milho transgênico estava proibida. Assim que liberaram, milagrosamente em apenas uma safra, as empresas forneceram sementes para atender 40% da demanda. Isso terá um impacto futuro na agricultura familiar destruidor, como já aconteceu no México.
Já comentei aqui desta tribuna e reforço o olhar dos movimentos sociais sobre o conteúdo da MP 458. Esta Medida define novos critérios e praticamente legaliza todas as terras públicas griladas na Amazônia, em até 1500 hectares por pessoa. Isso demonstra um claro abandono da Reforma Agrária, pois, ao invés de exigir a imediata arrecadação pela União das terras acima de 15 módulos fiscais e sua destinação para o Incra, designa estas áreas para licitação, com direito de preferência para o atual grileiro! Portanto, está consumada a regularização do grilo, além de sucatear aquela autarquia, porque vai transferir técnicos, diretores e demais estruturas do Incra para o projeto de regularização. Segundo denunciaram todas as entidades envolvidas no Fórum Nacional de Reforma Agrária a proposta da MP 458 tem clara afronta a preceitos constitucionais que devem ser contestados no STF.
Está na pauta do MST a necessidade de se atacar a prática de trabalho escravo. Como todos sabem está parada na Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda Constitucional que determina a desapropriação de todas as fazendas onde foram encontrados trabalhadores em situação análoga à escravidão. O Senado Federal já fez sua parte. Mas, por articulações políticas dos ruralistas, o governo se rendeu e não mobilizou sua base para aprová-la. Enquanto isso, a Polícia Federal continua libertando pessoas que vivem em condições de trabalho escravo nas fazendas e já registrou que 58% das fazendas são reincidentes.
São estas as razões que levam os trabalhadores rurais sem-terra a marcharem por todo o Brasil.
Aproveito para registrar a minha completa indignação diante do ataque da milícia armada pertencente ao banqueiro Daniel Dantas, que em uma de suas inúmeras fazendas adquiridas com os recursos desviados do povo brasileiro, abriram fogo contra sem-terras e feriram gravemente vários deles. É necessário que as fazendas fruto da roubalheira sejam imediatamente desapropriadas para fins de reforma agrária. E que a polícia estadual investigue corretamente o episódio ocorrido neste final de semana.
Senado Federal, 22 de abril de 2009.
Senador José Nery Azevedo
Líder do PSOL