Reinaldo Gonçalves
1. Introdução
O objetivo central deste texto é fazer uma radiografia da atual crise econômica internacional, analisar a especificidade da crise brasileira e apresentar algumas propostas de solução. Na realidade, trata-se de um “retrato tamanho 3×4” que pretende destacar os traços gerais desta crise: causas, extensão, dimensão, natureza e medidas de contenção.
O texto tem como objetivo a apresentação de diretrizes gerais de contenção e solução da crise brasileira tendo em vista sua especificidade. O texto é limitado pelo seu escopo didático. E não se tem a pretensão de análise mais detalhada tanto das questões como da tecnicalidade própria das medidas propostas. Por estas razões é que no final há uma lista de trabalhos relevantes que permitem o aprofundamento da análise das principais questões e das propostas de contenção.
2. Radiografia da crise mundial
A avaliação das tendências da atual crise econômica internacional depende do entendimento a respeito das suas causas, extensão, dimensão, natureza e medidas de contenção. A causa imediata da crise é a insolvência generalizada no sistema de hipotecas imobiliárias nos Estados Unidos. Esta insolvência resultou da expansão do crédito que tem determinantes conjunturais e estruturais. Dentre os conjunturais, houve a redução significativa da taxa de juro nos Estados Unidos. A taxa básica caiu de 6% no início de 2001 para 1% em meados de 2004. Este fato causou a expansão da demanda por empréstimos em geral e, por empréstimos imobiliários, em particular. A elevação dos preços dos imóveis estimulou a tomada de mais empréstimos para ganhos imobiliários.
Os fatores estruturais da expansão extraordinária do crédito foram a desregulamentação do setor financeiro e o menor dinamismo do setor real. Este último fato implica o deslocamento do capital do setor produtivo para o financiamento e a globalização financeira (aplicações financeiras em escala global). A desregulamentação financeira caracterizou-se, entre outros aspectos, pelos empréstimos sub-prime, ou seja, empréstimos de má qualidade no setor imobiliário, e pela grande alavancagem dos agentes financeiros, principalmente os bancos de investimento.
A globalização envolve crescente interdependência entre os sistemas financeiros nacionais. Esta interdependência gera a extensão global da crise. De fato, a crise afeta o centro do sistema econômico internacional (Estados Unidos), atinge o extremo oriente (Japão e Coréia do Sul), chega praticamente ao pólo norte (Islândia e Rússia) e repercute no sul das Américas (Chile e Brasil).
Tão importante quanto a extensão global é o caráter multidimensional da crise. Nos países desenvolvidos há crise sistêmica no setor financeiro. Ela transcende este setor e atinge o lado real da economia de forma que uma das tendências gerais é a forte desaceleração e, eventualmente, a recessão econômica em muitos países. Esta crise tem, ainda, clara dimensão política quando se torna evidente a fragilidade dos grupos dirigentes. Nos Estados Unidos, há que se reconhecer em Bush um presidente sub-prime. Neste sentido, a perda de confiança na administração Bush contrasta com a revitalização do governo do Labour Party britânico. O impacto social advém, principalmente, do desemprego, bem como da perda de renda e de patrimônio do trabalhador.
A crise atual revelou a natureza predatória do capitalismo, principalmente no contexto da liberalização e da desregulamentação próprias do regime liberal. Portanto, a crise atual caracteriza-se pelo extraordinário poder letal do “moinho satânico” do mercado de capitais na ordem capitalista internacional.
Por fim, restam as medidas de contenção. Em um período muito curto tem se verificado a implementação de inúmeras medidas para a resolução da crise nos países desenvolvidos.
Considerando o estoque de conhecimento científico sobre crises reais, financeiras e cambiais, bem como a experiência histórica, é possível agregar as medidas de contenção em seis baterias.2
A primeira bateria de medidas é a expansão da liquidez, ou seja, maior disponibilidade de recursos de empréstimos para agentes financeiros e, até mesmo, para empresas de outros setores.
A segunda bateria de medidas envolve o saneamento financeiro por meio das falências, concordatas, fusões e aquisições de bancos, financeiras, seguradoras, etc. Este processo iniciou-se nos Estados Unidos com a falência do Lehman Brothers em 15 de setembro de 2008 e se estendeu para a Europa e o resto do mundo.
A terceira bateria de medidas é a estatização parcial ou total dos agentes financeiros. Este processo já está ocorrendo, principalmente, na Europa. A Grã-Bretanha é um dos países que tem se destacado nesta direção. Em meados de outubro de 2008 foram injetados US$ 64 bilhões em três grandes bancos privados. Nos Estados Unidos houve a estatização das duas grandes seguradoras de crédito imobiliário (Fannie Mae e Freddie Mac) em setembro de 2008.
A quarta bateria de medidas implica garantias de empréstimos, depósitos e aplicações financeiras. Na Alemanha este tipo de garantia tornou-se quase total e os valores estimados chegam a US$ 700 bilhões. Em muitos países houve aumento dos limites de garantia de depósitos à prazo e à vista.
A quinta bateria consiste nas políticas macroeconômicas, monetárias e fiscais, expansionistas. Trata-se, mais especificamente, da redução das taxas de juros e da expansão dos gastos públicos para conter a queda do nível de atividade econômica. O Banco Central dos Estados Unidos e o Banco Central Europeu, bem como bancos centrais de outros países, coordenaram a redução da taxa de juro no início de outubro de 2008. Governos europeus também anunciaram medidas para estimular o investimento das empresas industriais e de outros setores produtivos. O objetivo é sustentar a demanda agregada.
A sexta bateria de medidas está focada no enfrentamento da crise cambial. Ela é particularmente importante em países marcados por forte vulnerabilidade externa. Há inúmeros mecanismos de intervenção. Estes mecanismos podem ser separados em dois grupos: intervenção soft e intervenção hard. A primeira consiste nas operações de oferta de dólares no mercado spot com o uso das reservas internacionais, os leilões de “linha” (compromisso de recompra), operações de swap cambial, não-resgate de swap cambial reverso (governo comprando dólares no vencimento dos contratos), operações nos mercados futuro, a termo e de derivativos, e emissão de títulos com correção cambial.
A intervenção hard envolve o controle direto do mercado de câmbio (conversibilidade) e da mobilidade de capitais (controle de entrada e saída). Os principais instrumentos são as taxas múltiplas de câmbio, a centralização do câmbio em uma autoridade monetária (ou seu representante), a obrigatoriedade da internalização da receita de exportação, e a proibição temporária ou definitiva de fluxos específicos de entrada e saída de capitais.
A sétima bateria de medidas está focada na redução do impacto social da crise econômica. Estas medidas variam significativamente quanto ao seu foco. Para ilustrar, há a flexibilização e ampliação do esquema de seguro-desemprego, o vale-alimentação e as políticas assistencialistas em diversas áreas. Há, também, o refinanciamento de dívidas, em geral, e de hipotecas imobiliárias, em particular. Os governos também podem criar mecanismos que travam os processos de execução de hipotecas imobiliárias ou arresto de imóveis por falta de pagamento, principalmente, no caso dos segmentos de menor nível de renda. Nos Estados Unidos, em decorrência do aumento extraordinário da inadimplência, o governo criou esquemas especiais para o refinanciamento imobiliário e para travar execuções hipotecárias.
3. Crise no Brasil: Especificidades e soluções
A eclosão da crise no Brasil levou o governo a tomar as medidas de primeira bateria, ou seja, medidas orientadas especificamente para a expansão da liquidez. A maior disponibilidade de recursos de empréstimos para agentes financeiros, empresas exportadoras e construtoras envolveu, principalmente, a flexibilização do redesconto, a redução dos depósitos compulsórios, a expansão do crédito para o agronegócio e a ampliação do financiamento do setor exportador em geral.
No que se refere à segunda bateria de medidas, que abarca o saneamento financeiro, o governo brasileiro ainda não explicitou mecanismos específicos. Em época de grave crise financeira é fundamental a criação de esquemas rápidos e eficazes para o tratamento de falências, concordatas, fusões e aquisições de bancos, financeiras, seguradoras, etc.
A terceira bateria de medidas é a estatização parcial ou total dos agentes financeiros. A Medida Provisória No. 443 (22 de outubro de 2008) permite ao Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal comprarem participação em empresas financeiras (bancos, seguradoras, empresas de previdência, capitalização, etc.) e construtoras3.
A quarta bateria de medidas implica garantias de depósitos, empréstimos e aplicações financeiras. O governo Lula ainda não tomou medidas nesta direção.
A quinta bateria abrange redução das taxas de juros, expansão dos gastos públicos, redução da carga tributária, restituição do imposto de renda para pessoas físicas de baixa renda e medidas para estimular o setor produtivo com o objetivo de conter a queda do nível de atividade econômica. No Brasil, após a eclosão da crise a taxa de juro básica da economia não se alterou enquanto as taxas efetivamente cobradas no mercado financeiro aumentaram em razão da contração da liquidez. O governo Lula também sinalizou com a perspectiva de corte de gastos. Por exemplo, a medida provisória de aumento do salário do funcionalismo público condicionou os reajustes futuros programados à situação orçamentária. A pressão do sistema financeiro é no sentido de corte nos gastos de capital e, principalmente, de custeio para que haja folga (via superávit primário) para o serviço da dívida pública. Mais especificamente, o corte de gastos permite a manutenção de juros elevados que beneficia diretamente a classe dos rentistas e o sistema financeiro.
A sexta bateria de medidas está focada no enfrentamento da crise cambial. Apesar de o Real ter sofrido forte desvalorização em outubro, o governo Lula restringiu suas medidas à intervenção soft, ou seja, venda de dólares no mercado spot (redução das reservas internacionais), leilões de “linha”, leilões de swap, não-resgate de swap reverso e venda de dólares para o financiamento de exportadores. O governo ainda não se utilizou da emissão de títulos públicos com correção cambial, que na crise de 1999 chegaram a representar mais de um terço do valor total da dívida mobiliária federal. Entretanto, na prática, o mecanismo de swap cambial tem o mesmo efeito negativo sobre as finanças públicas em trajetórias de desvalorização cambial.
A sexta bateria de medidas, focadas na redução do impacto social da crise, não mereceram a atenção por parte do governo Lula. Ainda que, no período imediatamente após a eclosão da crise, o impacto social não seja tão evidente, é fundamental explicitar diretrizes e compromissos em relação a esta questão com o intuito de melhorar as expectativas (insegurança) e conter ondas de pânico.
Este balanço das medidas tomadas após a eclosão da crise financeira, cambial e econômica mostra que o Governo Lula tem se restringido a um conjunto de medidas que se enquadram na chamada “estratégia da linha de menor resistência”. Nesta estratégia a maior parte das medidas contempla: regulação da liquidez; sustentação do setor financeiro; proteção da renda do agronegócio; estímulo às construtoras; e, esforços no sentido de evitar a megadesvalorização cambial. De fato, os beneficiários diretos da estratégia da linha de menor resistência são setores dominantes no atual governo4.
O ponto central consiste no seguinte: é preciso que o governo haja com maior firmeza antes que as reservas internacionais caiam em demasia e atinjam o “nível crítico”, a partir do qual os ataques especulativos são irreversíveis, na lógica dos modelos de primeira geração de crise cambial. É fundamental também que o governo defina claramente a trajetória futura dos focos das políticas macroeconômicas fundamentais, principalmente, a monetária (taxa de juro) e a fiscal (gastos). A ambivalência quanto ao rumo das políticas e à consistência macroeconômica provocarão expectativas desfavoráveis no mercado. Estas expectativas causarão ataques especulativos, via saídas líquidas abruptas e significativas de capitais, que agravarão ainda mais a pressão sobre o mercado de divisas e as reservas internacionais. As expectativas auto-realizáveis, na ótica dos modelos de segunda geração, implicam crise cambial aguda.
Crises cambiais se caracterizam pela ocorrência de pelo menos um dos fenômenos: maxidesvalorização cambial; forte saída de capitais; grande elevação da taxa de juro; redução significativa das reservas internacionais; moratória; e, acordo com o FMI.
O fato é que a estratégia da linha de menor resistência, que tem forte viés pró setores dominantes (bancos e agronegócio) subestima o risco da crise econômica brasileira. Portanto, falta ao governo Lula tomar medidas que efetivamente estejam à altura da crise atual e evitem a eclosão de uma mega crise cambial.
Neste ponto vale notar a especificidade e gravidade da situação brasileira. Nos países desenvolvidos há “crises gêmeas”: crise real decorrente da significativa desaceleração ou queda do nível de atividade (recessão) e crise financeira (crise sistêmica). No Brasil há as crises gêmeas que atingem os países desenvolvidos, bem como outras crises ou incertezas críticas.
A crise cambial é, sem dúvida alguma, uma especificidade brasileira. Esta especificidade decorre do erro grave do governo Lula no sentido de permitir o extraordinário desalinhamento cambial (queda da taxa de câmbio efetivo real) do país. Este desalinhamento foi, de fato, o maior na América Latina quando se toma uma perspectiva de mais longo prazo (2003-07). Em uma perspectiva de médio prazo (2005-07), somente o Paraguai teve maior desalinhamento cambial (Gonçalves, 2008, Quadro .
Devido ao desalinhamento cambial extraordinário, o Brasil teve a maior desvalorização cambial no período pós-eclosão da crise mundial, no conjunto das 11 principais economias da América Latina. Como mostra o Gráfico 1 seguinte, tomando 1º de julho de 2008 como referência, as maiores desvalorizações cambiais observadas em 24 de outubro de 2008 foram: Brasil = 47,5%; México = 34,5%; Colômbia = 23,0%; Chile = 22,4%; Uruguai = 16,0%; e, Paraguai = 15,4%. Estes países compõem, precisamente, o grupo de economias com maior probabilidade de serem atingidas pela crise internacional segundo a análise com dados pré-crise, que contempla riscos econômicos e financeiros (Ibid).
A desvalorização média observada foi de 15,6% para os onze países e 17,1% quando se exclui o Equador (regime de dolarização). Ou seja, a maxidesvalorização cambial brasileira foi quase três vezes maior do que a desvalorização média da região.
A Argentina, por seu turno, teve desvalorização cambial de 7,2%. O fato é que o governo argentino tem conduzido com eficiência sua política cambial nos últimos anos. Esta política implica manutenção da taxa de câmbio efetiva real e a acumulação de reservas sem ônus para as finanças públicas tendo em vista o imposto de exportação sobre commodities. O governo Lula fez exatamente o contrário.
A situação cambial brasileira é particularmente grave tendo em vista o crescente desequilíbrio de fluxos (deterioração das contas do balanço de pagamentos) e o elevado desequilíbrio de estoque (níveis elevados de passivo externo líquido e passivo externo de curto prazo) (Ibid)5. Cabe ainda mencionar a extraordinária vulnerabilidade externa estrutural do país – nas esferas comercial, produtiva, tecnológica, e monetário-financeira –, que aumentou durante o governo Lula (Filgueiras e Gonçalves, 2007).
Além de haver grave crise cambial (expressa na maxidesvalorização, na queda das reservas internacionais e nas medidas tomadas pelo governo), o país tem vulnerabilidade externa estrutural muito séria. Esta vulnerabilidade decorre, principalmente, da forte dependência em relação ao mercado internacional de commodities, da liberalização cambial e financeira, e do elevado grau de internacionalização da produção do país (não residentes controlam aproximadamente um quarto do PIB brasileiro).
No que se refere à vulnerabilidade externa na esfera comercial, a eclosão da crise internacional implicou queda forte e abrupta dos preços das commodities. Isto afeta não somente o saldo da balança comercial brasileira como também a geração de renda interna tendo em vista a importância relativa do setor primário-exportador (alimentos, minérios, etc.). Portanto, via multiplicador de comércio exterior, a renda no conjunto da economia brasileira sofre o impacto da queda das exportações. Surge, então, um problema sério para o Brasil: a dinâmica da absorção interna (consumo e investimento) é significativamente afetada pelo desempenho das exportações. Ou seja, a demanda interna é exogenamente determinada. A situação se agrava no quadro da política fiscal marcada pelo mega superávit primário que inibe a outra fonte de expansão da demanda agregada que é o gasto público.
A questão da política fiscal nos remete à má governança. A má governança expressa, na realidade, a incompetência operacional da área econômica do governo Lula, bem como sua “preferência revelada” pela estratégia da “linha de menor resistência”. Esta estratégia atende, prioritariamente, aos interesses dos setor financeiro e do agronegócio. A má governança se expressa, ainda, na ambigüidade e na falta de consistência das políticas macroeconômicas, o que afeta desfavoravelmente as expectativas.
Por fim, a má governança abrange as operações de resgate e capitalização de empresas financeiras e não-financeiras. Estas operações podem ocorrer no contexto de fracos marcos regulatórios, legais e institucionais. Portanto, abre-se espaço para decisões discricionárias e práticas oportunistas. Em conseqüência, cria-se o risco moral (estimulando mais práticas oportunistas) e eleva-se o custo de resolução da crise.
Ainda como incerteza crítica específica do Brasil há a pressão inflacionária decorrente da maxidesvalorização cambial. Nos países desenvolvidos, a recessão, a queda dos salários e a redução dos preços das commodites contribuem para a queda da inflação. Por outro lado, no Brasil surge a inflação de custo em decorrência da maxidesvalorização cambial. E isto ocorre no contexto de contenção da demanda interna (consumo e investimento) em decorrência da contração e do encarecimento do crédito, bem como da própria desaceleração do crescimento da renda.
Resumindo a especificidade da atual crise brasileira, temos: crise no lado real, crise financeira, crise cambial, crise no setor de commodities, deterioração acelerada dos desequilíbrios de fluxos externos (balanço de pagamentos), risco decorrente do elevado desequilíbrio de estoque (passivo externo de curto prazo), pressão inflacionária e má governança. O Quadro 1 mostra a diferença do padrão de crises gêmeas nos países desenvolvidos e a natureza múltipla da crise no Brasil.
Frente aos graves problemas e riscos, o governo Lula precisa implementar rápida e consistentemente outras baterias de medidas. Estas medidas urgentes estão destacadas em vermelho no Quadro 2 seguinte.
A classificação nos três grupos (sistema financeiro, geral e trabalhadores) é, naturalmente, controversa. O objetivo, entretanto, é destacar que as medidas têm foco mais particular (interesses específicos) ou mais geral. No caso brasileiro esta distinção é muito relevante tendo em vista a forte influência do setor financeiro e do agronegócio nas diretrizes da política econômica do governo Lula.
Trata-se, fundamentalmente, de implementar as seguintes medidas:
1. Redução da taxa de juro básica e na ponta dos empréstimos
2. Aumento dos limites de garantias de depósitos
3. Punição da administração temerária
4. Controle pela sociedade das operações de resgate e capitalização
5. Imposto de exportação
6. Internalização da receita de exportação
7. Redução da carga tributária sobre os trabalhadores
8. Expansão dos gastos públicos
9. Controles de capitais (entrada e saída)
10. Controle do câmbio
4. Síntese
A atual crise tem causas estruturais, extensão global, dimensão múltipla e natureza sistêmica. Por estas razões os governos, principalmente dos países desenvolvidos, têm apelado para medidas de contenção de grande profundidade e amplo escopo. Antibióticos de grande impacto e amplo espectro são, geralmente, respostas às doenças graves e têm fortes efeitos colaterais. Esta metáfora sugere que a crise atual tem tendências marcadas por grande instabilidade, mudanças importantes em escala global (e.g., re-regulamentação do sistema financeiro, maior presença do Estado na atividade produtiva, restrições à liberalização cambial e financeira), e custo elevado em termos de produção, renda e finanças públicas durante longo período.6
A situação brasileira é particularmente grave em decorrência das vulnerabilidades e fragilidades do país, bem como dos erros de estratégia e política do governo Lula. Os países desenvolvidos defrontam-se com crises gêmeas (lado real e setor financeiro), enquanto no Brasil o espectro de crises e incertezas críticas é muito maior: crise no lado real, crise financeira, crise cambial, crise no setor de commodities, deterioração acelerada dos desequilíbrios de fluxos externos (balanço de pagamentos), elevado desequilíbrio de estoque (passivo externo de curto prazo), pressão inflacionária e risco de má governança.
Após a eclosão da crise no Brasil, o governo Lula tem se limitado a um conjunto de medidas que se enquadram na chamada “estratégia da linha de menor resistência”. Nesta estratégia a maior parte das medidas tem viés pró setores dominantes (bancos, agronegócio e construtoras).
Não há dúvida que o governo Lula subestima os riscos de ocorrência de crise cambial e econômica ainda mais grave no país. O argumento central é que a crise atual brasileira tem repercussões e está envolvida em incertezas críticas muito mais sérias do que aquelas implícitas nas medidas tomadas pelo governo Lula no imediato pós-crise nos Estados Unidos. Não há dúvida que nos países desenvolvidos e, mais ainda no Brasil, a crise atual é multidimensional. Portanto, é necessário tomar medidas que efetivamente evitem a eclosão de uma mega crise cambial e econômica e que estejam à altura do potencial de destruição da crise atual.
Neste texto foram apresentadas algumas medidas mais gerais como, por exemplo, a redução das taxas de juros, a expansão dos gastos públicos e a introdução de controles de capitais. A proposta contempla, ainda, medidas mais específicas que beneficiam o trabalhador como, por exemplo, maiores garantias de depósitos e redução da carga tributária. A crise atual também é uma excelente oportunidade para se fazer uma reforma tributária focada na progressividade e na redistribuição de riqueza e de renda do capital para o trabalho.
Além de beneficiar os trabalhadores e os outros grupos e classes sociais, as medidas propostas reduzirão o risco de aprofundamento da crise multidimensional brasileira. Estas propostas objetivam, ainda, eliminar o custo da estatização de grandes bancos e fundos de pensão no contexto da combinação explosiva: eclosão da crise financeira sistêmica, risco moral e má governança7.
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