O deputado federal Ivan Valente protocolou nesta quinta-feira em Brasília e apresentará, na próxima reunião da Comissão Especial do Código Florestal, agendada para o dia 29 de junho, um voto em separado ao relatório oficial, redigido pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP). O documento defende a manutenção da atual legislação, além de criticar a descentralização da legislação para estados e municípios e rebater algumas premissas que teriam orientado a proposta do relator.
Na avaliação de Ivan Valente, o relatório final da Comissão Especial parte de premissas equivocadas e se apropria de forma distorcida de conceitos e fatos históricos para defender mudanças na legislação ambiental brasileira que, caso aprovadas, levarão o país a cometer um enorme retrocesso em termos de proteção do meio ambiente e da biodiversidade brasileira.
“Por trás da retórica empregada no relatório está a resposta, há tanto tempo solicitada pela bancada ruralista desta Casa, para as exigências de flexibilização das leis feitas pelo agronegócio exportador de commodities. Uma bancada que, financiada ou ela própria integrada por grandes proprietários de terra, promove ataques sistemáticos ao Código Florestal e a qualquer iniciativa de alteração no modelo de desenvolvimento brasileiro. E que conseguiu, com o relatório final apresentado à Comissão, ver parte significativa de seus pleitos atendida, colocando o Brasil no rumo do atraso e da devastação”, afirmou Valente.
A primeira premissa equivocada é a existência de uma ameaça internacional que, via o financiamento de organizações não governamentais ambientalistas, pretenderia impedir o Brasil de ampliar suas fronteiras agrícolas e, assim, manter sua competitividade no mercado exterior.
“Não é a primeira vez que o deputado Aldo Rebelo se utiliza de um fantasma da invasão estrangeira e, em nome de um suposto nacionalismo, se coloca como guardião dos interesses dos grandes produtores agrícolas. Desta vez, no entanto, foi muito longe. Comparar a invasão holandesa e a vinda de Maurício de Nassau para o Brasil na época da colonização com o financiamento de ONGs por organizações holandesas para, finalmente hoje, alcançarem o objetivo fracassado séculos atrás comprova apenas a criatividade presente no relatório. Além de provocativo, agressivo e desrespeitoso, o texto é fantasioso ao criar uma luta imperialista contra moinhos de vento para justificar as alterações no Código Florestal. Não somos nós que nos ajoelhamos durante tanto tempo ao comércio internacional via cartilha da OMC. Pelo contrário. Esta sempre foi a política dos partidos que, agora, defendem o relatório da Comissão Especial”, disse o deputado.
A segunda premissa equivocada do relator é a de que seria necessário ocupar todas as áreas agricultáveis do território nacional – inclusive as de Reserva Legal e de Proteção Permanente (APPs) – para garantir a competição agrícola e a produção de alimentos para todos os brasileiros. Inúmeras pesquisas demonstram que há terras disponíveis suficientes para se elevar a produção agrícola sem que seja necessário devastar a Amazônia. Ou seja, não é preciso enfraquecer a atual lei ambiental para garantir o desenvolvimento da agricultura no nacional.
Segundo o professor do departamento de solos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, Gerd Sparovek, mesmo com a aplicação de todas as regras instituídas pelo atual Código Florestal ainda sobrariam 104 milhões de hectares de florestas nativas que poderiam ser desmatadas. A área equivale a quatro vezes o estado de São Paulo. Somente nas áreas de pasto – terrenos que já foram modificados -, há terra fértil suficiente para dobrar a atual produção de grãos no Brasil: 60 Mha. Ou seja, o país tem a possibilidade de duplicar sua área de agricultura e pecuária sem mudar a lei.
Outro projeto de desenvolvimento
Na avaliação do deputado Ivan Valente, o Brasil precisa de outro projeto de desenvolvimento, diferente do defendido por aqueles que invadem terras indígenas, que reprimem movimentos em defesa da reforma agrária, que submetem trabalhadores a condições análogas à da escravidão e que praticam desmatamentos criminosos.
“Nossas florestas não são balcões de negócio; são bens de interesse comum a todos os habitantes do país. O fato de um terreno ser particular não exime seu proprietário de responsabilidades com o coletivo, como a preservação ambiental. Sobretudo no meio ambiente, há um interesse coletivo maior que não pode ser subjugado por interesses particulares. Os impactos do desmatamento da floresta tropical e de outros biomas do território brasileiro são conhecidos e altamente negativos em âmbito regional e nacional”, afirmou.
De acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), na Amazônia, por exemplo, a derrubada das árvores e a conversão do solo em plantação ou pasto alteram a dinâmica das chuvas na região e reduzem o volume de umidade essencial para a existência do Pantanal e para a agricultura no sudeste. Esta é uma situação que só se agrava com o efeito estufa, cuja redução está entre os compromissos internacionais do Brasil. Para atingir a meta do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) de controlar o acréscimo da temperatura até o fim do século em 2ºC, é fundamental que o Brasil alcance o desflorestamento zero em 2015.
“Mudar o Código Florestal não vai ajudar a atingir esta meta. Pelo contrário. Em vez de dilacerá-lo, o Estado Brasileiro precisa aperfeiçoá-lo e garantir seu pleno cumprimento”, declarou Ivan Valente.
Mesmo com a legislação atual, segundo o professor Gerd Sparovek, foram devastados 870 mil km2 de vegetação nativa nas Áreas de Proteção Permanente. Nas regiões de expansão agrícola em estados da Amazônia Legal, são raros os municípios que respeitam o percentual de 80% de Reserva Legal.
“Toda essa vegetação foi derrubada pela sanha de um setor que há tempos abandonou sua consciência social e ambiental e que agora será anistiado caso o relatório final do deputado Aldo Rebelo seja aprovado”, concluiu.